terça-feira, 8 de janeiro de 2008

VIM, VIR, VIER ou VER, eis as questões

Recentemente, a gerente de uma loja esbravejava pelo telefone. Falando tão alto que todos puderam ouvir: "Se ela não vim, vai ser demitida. E se tu vê ela por aí, pode avisar."
A raiva era tanta que a tal senhora mandou as regras da gramática lá sabe Deus para onde.
Em primeiro lugar, vamos analisar o"se ela não vim". A frase está exigindo o futuro do subjuntivo do verbo VIR. Deveria ser: "Se ela não VIER..."
É importante lembrar que a forma VIM vem sendo muito mal empregada. É a 1ª pessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo (=eu VIM, tu vieste, ele veio, nós viemos, vós viestes, eles vieram): "Ontem eu não VIM trabalhar".
Outro erro frequente, é o famoso "eu vou vim". Para quem não entendeu, esse erro ocorre quando o falante quer dizer "eu vou VIR". Nesse caso, confunde-se o infinitivo (VIR) com o pretérito perfeito do indicativo (VIM). O melhor mesmo seria dizer "eu VIREI" (= futuro do presente do indicativo do verbo VIR).
Quanto ao verbo VER, o erro mais frequente ocorre no futuro do subjuntivo: se eu VIR, tu VIRES, ele VIR, nós VIRMOS, vós VIRDES, eles VIREM. Portanto, na frase" se tu vê ela", temos dois erros:
1º) O verbo VER deveria estar no futuro do subjuntivo, concordando com o sujeito (=TU): "se tu VIRES...". Também estaria correto: "se você VIR" (=na 3ª pessoa);
2º) O pronone pessoal reto (ELA) deveria ser substituído pelo pronome pessoal oblíquo, porque se trata de objeto direto: "se tu a vires" ou "se você a vir".
Eu sei que essas formas são poucos usuais no Brasil, principalmente, num momento de raiva, quando o nível de fala é outro. Ninguém exige uma linguagem formal na hora em que desejamos desabafar a nossa ira. É nessas horas que o registro vulgar se manifesta. E, nesses momentos, muitos põem a gramática de lado.
O que nos cabe, como seres inteligentes que somos, é adequar a linguagem. Em situações informais, geralmente usamos um registro popular-coloquial, que não se caracteriza pelo respeito total às normas da gramática.
Entretanto, é importante que isso não sirva de desculpa para nossa ignorância ou relaxamento. É bom não esquecer que é necessário ter o conhecimento gramatical para as situações em que o registro formal seja exigido.

Retirado da Coleção Aula Extra - Português Sem Complicação - Vol. III Verbos - Professor Sérgio Nogueira, página 04.
Postado por Karine.

domingo, 30 de dezembro de 2007

A DOMICÍLIO X EM DOMICÍLIO

Aníbal Bruno


Entrega-se remédio a domicílio (errado). Entrega-se remédio em domicílio (correto). Explicação: substitui-se domicílio por casa. O que resulta? Surge o EM, a saber: entrega-se remédio em casa.


Em “NOVA GRAMÁTICA DA LÍNGUA PORTUGUESA” (Editora FORENSE; Rio de Janeiro/RJ). Fone: 0xx21.3299.1971.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Para provocar polêmica: Ele foi PEGO ou PEGADO em flagrante?

Existem alguns verbos que nos deixam de cabelo em pé: GANHO ou GANHADO, GASTO ou GASTADO, PAGO ou PAGADO, PEGO ou PEGADO?
Alguns gramáticos defendem o uso exclusivo das formas clássicas: GANHADO, GASTADO, PAGADO e PEGADO. Outros preferem o uso exclusivo daquelas formas que o brasileiro consagrou: GANHO, GASTO, PAGO e PEGO.
Há ainda os moderados. São aqueles que aceitam as duas formas de acordo com a regra dos particípios abundantes:
1) Após os verbos TER ou HAVER, devemos usar a forma clássica: tinha aceitado, havia supendido, tinha ganhado, havia gastado, tinha pagado;
2) Após os verbos SER ou ESTAR, usamos a forma irregular: foi aceito, estava suspenso, fora ganho, era gasto, será pago.
O mestre Celso Cunha defende o uso de ganho, gasto, e pago após qualquer verbo auxiliar: ser ou ter ganho, ser ou ter gasto. Assim sendo, "a conta foi paga", mas ele tinha pago ou pagado a conta".
Concordo com o professor Celso Cunha. Não podemos jogar no lixo as formas clássicas nem ignorar as novidades lingüísticas. Incluo ainda o verbo PEGAR. A forma PEGADO estará sempre correta, mas a forma PEGO está consagradíssima: "Ele tinha PEGADO os documentos" e "Ele foi PEGO em flagrante".
Inaceitáveis ainda são as tais histórias de "ele tinha chego" e "ele tinha trago". Nesse caso, no padrão culto da língua portuguesa, as formas clássicas estão preservadas: "ele tinha chegado" e "ele tinha trazido".
Fonte: Português sem Complicação. Vol. III .Verbos. Professor Sérgio Nogueira .
Sugestão: Programa de Palavra exibido na Rede Sesc TV.

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Quando o português chegou
Debaixo duma bruta chuva
Vestiu o índio.
Que pena!
Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
o português.

(Oswald de Andrade)

domingo, 9 de dezembro de 2007

Um Conto Erótico na Legítima Versão Portuguesa...

Pra quem gosta de Português é só se deliciar!!! Delícia de conto !!!!! Inteligente, picante, bem humorado e, sobretudo, uma aula da língua mãe!!!!

Pena que não sabem a autoria.

"Era a terceira vez que aquele substantivo e aquele artigo se encontravam no elevador. Um substantivo masculino, com um aspecto plural, com alguns anos bem vividos pelas preposições da vida.

E o artigo era bem definido, feminino, singular: era ainda novinha, mas com um maravilhoso predicado nominal.

Era ingênua, silábica, um pouco átona, até ao contrário dele: um sujeito oculto, com todos os vícios de linguagem, fanáticos por leituras e filmes ortográficos.

O substantivo gostou dessa situação: os dois sozinhos, num lugar sem ninguém ver e ouvir. E sem perder essa oportunidade, começou a se insinuar, a perguntar, a conversar. O artigo feminino deixou as reticências de lado, e permitiu esse pequeno índice.

De repente, o elevador pára, só com os dois lá dentro: ótimo, pensou o substantivo, mais um bom motivo para provocar alguns sinônimos. Pouco tempo depois, já estavam bem entre parênteses, quando o elevador recomeça a se movimentar: só que em vez de descer, sobe e pára justamente no andar do substantivo.

Ele usou de toda a sua flexão verbal, e entrou com ela em seu aposto. Ligou o fonema, e ficaram alguns instantes em silêncio, ouvindo uma fonética clássica, bem suave e gostosa. Prepararam uma sintaxe dupla para ele e um hiato com gelo para ela. Ficaram conversando, sentados num vocativo, quando ele começou outra vez a se insinuar. Ela foi deixando, ele foi usando seu forte adjunto adverbial, e rapidamente chegaram a um imperativo, todos os vocábulos diziam que iriam terminar num transitivo direto.

Começaram a se aproximar, ela tremendo de vocabulário, e ele sentindo seu ditongo crescente: se abraçaram, numa pontuação tão minúscula, que nem um período simples passaria entre os dois. Estavam nessa ênclise quando ela confessou que ainda era vírgula: ele não perdeu o ritmo e sugeriu um longo ditongo oral, e quem sabe, talvez, uma ou outra soletrada em seu apóstrofo. É claro que ela se deixou levar por essas palavras, estava totalmente oxítona às vontades dele, e foram para o comum de dois gêneros.

Ela totalmente voz passiva, ele voz ativa. Entre beijos, carícias, parônimos e substantivos, ele foi avançando cada vez mais: ficaram uns minutos nessa próclise, e ele, com todo o seu predicativo do objeto, ia tomando conta dela inteira.

Estavam na posição de primeira e segunda pessoas do singular, ela era um perfeito agente da passiva, ele todo paroxítono, sentindo o pronome do seu grande travessão forçando aquele hífen ainda singular.

Nisso a porta abriu repentinamente. Era o verbo auxiliar do edifício. Ele tinha percebido tudo, e entrou dando conjunções e adjetivos nos dois, que se encolheram gramaticalmente, cheios de preposições, locuções e exclamativas. Mas ao ver aquele corpo jovem, numa acentuação tônica, ou melhor, subtônica, o verbo auxiliar diminuiu seus advérbios e declarou o seu particípio na história. Os dois se olharam, e viram que isso era melhor do que uma metáfora por todo o edifício. O verbo auxiliar se entusiasmou, e mostrou o seu adjunto adnominal.

Que loucura, minha gente. Aquilo não era nem comparativo: era um superlativo absoluto. Foi se aproximando dos dois, com aquela coisa maiúscula, com aquele predicativo do sujeito apontado para seus objetos. Foi chegando cada vez mais perto, comparando o ditongo do substantivo ao seu tritongo, propondo claramente uma mesóclise-a-trois.

Só que as condições eram estas: enquanto abusava de um ditongo nasal, penetraria ao gerúndio do substantivo, e culminaria com um complemento verbal no artigo feminino.

O substantivo, vendo que poderia se transformar num artigo indefinido depois dessa, pensando em seu infinitivo, resolveu colocar um ponto final na história: agarrou o verbo auxiliar pelo seu conectivo, jogou pela janela, e voltou ao seu trema, cada vez mais fiel à língua portuguesa, com o artigo feminino colocado em conjunção coordenativa conclusiva."


O Porquê dos Porquês

Por que? Por que? Porque? Porquê?
É um Deus-nos-acuda. Ora a dupla vem coladinha. Ora, separada.
Às vezes com acento. Outras, sem lenço nem documento. Quem entende?
É um nó nos miolos. Jornalistas, advogados, professores, estudantes & gente boa como nós chamam por socorro. O que fazer?

Há dois empregos pra lá de conhecidos. Gente de casa, quase todo mundo os domina. Na época em que escola ensinava e o aluno aprendia, a meninada decorava: na pergunta, o parzinho é separado. Se o quê estiver no fim da frase, no fim mesmo, encostado no acento, leva circunflexo. Caso contrário, vem soltinho da silva:

Por que e por quê

- Por que José Dirceu recorreu ao Supremo Tribunal Federal?

- José Dirceu recorreu ao Supremo Tribunal Federal por quê?

- Paulo, por que você chegou atrasado?

- Paulo, você chegou atrasado por quê?

- Maria, você é sempre tão atenta, anda distraída. Por que será?

- Maria, você sempre tão atenta, anda distraída. Por quê?

Porque

A resposta à questão é fácil como tirar pirulito de bebê. O parzinho vem colado. É a conjunção causa:

- José Dirceu recorreu ao Supremo porque se sentiu injustiçado.

- Paulo chegou atrasado porque acordou tarde.

- Maria anda distraída porque está apaixonada.

Porquê

O porquê, assim - juntinho e enchapelado - , joga no time dos substantivos. É sinônimo de causa, razão, motivo. Ele apresenta duas marcas. Uma tem plural. A outra: vem acompanhado de artigo, numeral ou pronome. Quer ver?

- Agora entendo o porquê dos porquês.

- Eis o porquê da distração de Maria.

- Esse porquê poucos entendem.

- O primeiro porquê é mais fácil do que o segundo.

Por que e por quê (de novo)

Esse porquê parece repeteco do primeiro. Parece, mas não é. Ele ganhou destaque porque representa um senhor perigo. Gente muito boa tropeça nele e cai como patinho ingênuo que nada no lago. O que fazer? Dar um jeito. Entender-lhe as manhas.Desvendado o mistéio, a verdade é uma só - o diabo não é tão feio como o pintam. É malandro. Cotnra ele, malandragem e meia.

Vamos aos fatos

O porquê separado sem estar em pergunta é construção preguiçosa. Aparece pela metade. Sem muita disposição pelo batente, deixa subentendidos os substantivos a razão, a causa, o motivo.

- Gostaria de saber (a razão) por que José Dirceu recorreu ao STF.

- É possível me dizer (o motivo) por que Júlia Assumpção odeia a avó Bia?

- Ainda não sabemos (as causas) por que o Brasil invadiu o Paraguai.

Viu? Antes do porquê está escondinho um substantivo. ele não aparece. Mas conta. É que a língua, engenhosa, o omite. Os distraídos caem na armadilha. Os sabidos têm um macete. Sempre que o porquê for substituível por a razão pela qual, não duvidam. É um lá e outro cá. Se estiver no fim da linha, colado no ponto, ganha chapéu:

- Não entendi por que (a razão pela qual) o PIB do Brasil caiu neste semestre.

- Este é o melhor filme do ano. Vá ao cinema e descubra por quê (a razão pela qual).

- No livro Intermitências da Morte, de José Saramago, as pessoas deixaram de morrer. Foi difícil saber por quê (a razão pela qual eles deixaram de morrer).

Resumo da Ópera

Descobrir o porquê dos quês e porquês não é nenhum bicho-de-sete-cabeças. Basta aprender por que uns se escrevem juntinhos; outros, separados. E abrir os olhos para as manhas dos acentos. Os chapeuzinhos têm seu porquê.


ps.: coluna retirada do jornal estado de minas. Por Dad Squarisi.


"Sempre que faz algo de que se envergonha, a pessoa diz que estava só cumprindo seu dever."
Bernard Show.